sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

JUSTIÇA RAFEIRA

Uma de duas: ou a justiça entonteceu ou nós, quase todos, estamos malucos.
Os casos são muitos, os factos abundam, o pequeno delito, que poderia ser resolvido com uma pena cívica, leva um jovem à cadeia, que é uma excelente escola de vícios. Entretanto, os gabirus de gravata, os gajos das grandes golpadas, os “vampiros” que chupam o sangue e o suor de quem trabalha, contratam advogados atrevidos, tratantes nas rábulas jurídicas, expeditos nos truques formais. E merecem reverências das televisões e dos jornalistas de “aeiou”.
Veja-se Sá Fernandes a achincalhar o Ministério Público com dichotes de inglês de taverna. Veja-se o Presidente da República, Supremo Magistrado, a ratificar toda a plena confiança no senhor Dias Loureiro, um salteador de fraque e requintado perfume.…
Mas tudo isto são pinceladas que marcam o surrealismo das nossas instituições judiciais e que o Bastonário da Ordem dos Advogados, com a autoridade da investidura e a coragem da gente da terra firme, frequentemente denuncia…A mim, o que mais me dói, o que me dá vómitos, o que me cheira mal mais que a trampa da latrina antiga é o caso da Esmeralda, a pequenina de Torres Novas, e a forma peçonhenta e animal como o tribunal trata uma criança.
Uma criança não é um ser biológico como um saco de batatas, como um vitelo, nem sequer como um gato que se possa traficar no mercado das leis.
Uma criança é, antes de mais, um corpo de relações afectivas, um encanto feito de ternuras insistentes e persistentes, uma dedicação com balizas de permissões e de interditos.
O papel do pai na criação é tão fundamental como ocasional. Uma queca de momento leva um arteiro espermatozóide à fecundação do óvulo. Depois o pai pode pirar-se, esquecer, desertar. No ventre materno cruzam-se e organizam-se as células do novo ser, que só a mãe carrega e alimenta…O pai pode, mas não deve, vadiar por longes portos, curtir outras fortunas, fecundar, fecundar, fecundar e cavar, zarpar, escapulir-se…
Esta foi a sorte da Esmeralda, cuja mãe, sem posses, a entregou aos pais dos afectos, das ternuras, dos carinhos. Aos pais que lhe deram o biberão, lhe mudaram as fraldas, acordaram pressurosos ao choro ocasional… A criança era um mimo num prado verde, um pássaro encantado num jardim de Primavera, ou perdido na abundância dum Outono fértil.
Eram cinco anos quando um Baltazar Nunes quis buscar o fruto da sua semente…
E o tribunal consente… Eu, é que não entendo.
Meu pai morreu quando eu tinha cinco anos. Não me recordo do orgasmo da procriação…. Mas como eu tenho saudades dele!!!!

2 comentários:

esperançoso disse...

Li e gostei das três postagens.Muito boas, bem escritas, por quem sabe e entende.Parabéns

17 de Janeiro de 2009 17:27

maria disse...

Escreve muito bem!
Gostei do texto, nasci em 1971, sei na primeira pessoa do que escreve....